Visão Holística das Organizações

Visão Holística das Organizações

Muitos dos problemas encontrados nas organizações se devem a uma falta de Visão Holística de Longo Prazo.

Silos de informação, feudos políticos, redundância, retrabalho, projetos cancelados, dificuldades de integração de processos e sistemas, todos esses são exemplos recorrentes de problemas deste tipo.

Como as áreas e seus altos executivos não querem ou não conseguem enxergar o que está acontecendo na sala ao lado, cada área acaba atuando como um ente isolado.

Há décadas se fazem propostas para resolver este problema. Uma das mais promissoras é a visão de processos. Infelizmente, mesmo em empresas onde essa visão foi implementada, o problema dos Silos e Feudos frequentemente continua se manifestando. Vemos, por exemplo, Escritórios de Processos em que os processos de negócio da empresa são mapeados e propostas de melhoria são feitas sem que sejam levados em conta, mais uma vez, a Estratégia e a Cultura da empresa. Os Escritórios de Processo se transformaram simplesmente e um novo Silo.

A falta da Visão Holística, integrada, impede a coordenação eficiente dos recursos da empresa e o seu alinhamento com a Estratégia e a Cultura da mesma. O que piora a situação é que, além disso, quase sempre as empresas e os executivos estão mais preocupados com a solução de problemas de curto prazo, vulgarmente conhecidos como “apagar incêndios”, em vez de manter os olhos postos na visão de longo prazo da empresa.

O que é Visão Holística

A palavra “holística” é um adjetivo relacionado à intenção de compreender os fenômenos na sua totalidade e globalidade. “Holos” (em Grego) significa “todo” ou “inteiro”.

Portanto, ter uma visão holística das empresas nada mais significa do que ser capaz não só de enxergar o todo, mas também o relacionamento entre suas partes. Este entendimento entre os relacionamentos poderia também ser chamado de Visão Sistêmica. Para efeitos deste artigo, porém, vou considerar as duas expressões como sinônimas.

Para termos uma Visão Holística, o primeiro passo é entender quais são os componentes que compõem uma organização. Isso pode ser feito de várias maneiras, mas eu gostaria de apresentar o que eu chamo de Modelo Tripartite das Organizações.

Modelo Tripartite das Organizações

O modelo tripartite das organizações se baseia na metáfora do ser humano. É frequente se dizer que o ser humano possui mente, corpo e alma.

Usando esta metáfora, podemos dizer que a mente da empresa está relacionada com a sua Estratégia, o corpo com a sua Arquitetura, e a alma com a sua Cultura Propósito.

Não foi fornecido texto alternativo para esta imagem


Se usarmos essa metáfora, veremos que, para a empresa funcionar direito, as três coisas precisam estar alinhadas. 

A Estratégia da empresa parte da sua Visão, e responde à pergunta “Onde queremos chegar e como?”. Para termos uma Visão Holística, é necessário que a Estratégia esteja alinhada com a Arquitetura e a Cultura. É frequente vermos Planos Estratégicos inviáveis por serem incompatíveis com a Arquitetura existente ou possível. Também vemos metas estratégicas que muitas vezes batem de frente com a Cultura da empresa.

A Arquitetura são os componentes da organização e como eles estão relacionados entre si. Inclui tudo que a empresa tem, como por exemplo sua estrutura organizacional (organograma), suas capacidades (capabilities), sua cadeia de valor e seus processos, as competências de seus colaboradores, suas tecnologias, seus sistemas de informação e infraestrutura de TI.

É aqui que ocorre a maior parte dos “problemas práticos”: falta de integração entre processos e sistemas, redundâncias, retrabalho, projetos inúteis e assim por diante.

Além disso, cada um desses componentes deveria estar alinhado à Estratégia e à Cultura holisticamente. Vemos, por exemplo, empresas que incluem em sua Estratégia o “Encantamento do Cliente”, e que, ao mesmo tempo, possuem processos de atendimento ao cliente que parecem desenhados especificamente para irritá-lo. Ou então organizações que dizem possuir uma “Cultura de Inovação”, mas que punem qualquer funcionário que tenta fazer algo diferente do que “sempre foi feito”, e não possuem estrutura nem processos definidos para inovação.

A Cultura, por sua vez, pode ser definida de forma simples com as crenças e valores compartilhados pelos membros da organização. Mais uma vez, não faz sentido temos uma Estratégia ou Arquitetura que confrontem essas crenças e valores.

Generalistas e Especialistas

Uma das causas da falta de visão holística é que, nos últimos três séculos, pelo menos desde o surgimento da Revolução Industrial, a pressão tem sido sempre no sentido da maior e maior especialização. O Polymath, o Renaissance Man, aquela pessoa que conhece muitos assuntos e é capaz de entender o relacionamento entre eles, esteve fora de moda provavelmente desde o Renascimento. Hoje, somos todos os especialistas. Ninguém mais quer ir ao clínico geral. O médico de família praticamente não existe mais. A pessoa sente dor nas costas, pesquisa o site do plano de saúde, e marca uma consulta com ortopedista, sem saber que o seu problema é nos pulmões. “Para quem tem um martelo, tudo no mundo e prego“, e é bem possível que o ortopedista diagnostique erradamente o paciente.

O que falta hoje são bons generalistas. É admissível a chamada “Especialização em T”, ou seja, a capacidade de ser um generalista (o traço horizontal superior da letra T maiúscula) ao mesmo tempo em que se é especializado em um ou outro assunto específico (a perna vertical do T).

É claro que os especialistas são úteis e necessários, mas não são suficientes. Foi a crença na necessidade e suficiência da sempre crescente especialização que nos levou o buraco em que estão a maioria das empresas. Ninguém é capaz de ver a empresa como um todo, em seus aspectos estratégicos, arquitetônicos e culturais.

Como desenvolver uma visão holística?

Ter visão holística, sistêmica, é uma competência e pode ser desenvolvida. Além disso, pode ser ajudada através de ferramentas.

Embora minha crença seja de que todo mundo dentro da empresa deveria ter visão holística, é evidente que este tipo de visão é simplesmente imprescindível para aquelas pessoas que ocupam posições na alta administração.

Como qualquer competência, ela inclui Conhecimentos, Habilidades e Atitudes.

Em termos de conhecimentos, para se atingir uma visão holística, é necessário que a pessoa se esforce para aprender mais sobre assuntos que não são de sua especialidade. Se você é um especialista em tecnologia, estude marketing, finanças, operações e os demais aspectos de funcionamento do negócio de sua empresa. Se você é o CFO, estude Marketing. Se você é o Diretor de Marketing, estude Finanças. E assim por diante. Não tem mágica!

Habilidades tais como o pensamento estratégico e sistêmico também podem ser desenvolvidas, e são necessárias para se adquirir uma visão holística. Aprofundar nessa discussão foge ao escopo deste artigo, mas voltaremos ao assunto no futuro.

Quanto às Atitudes, autoconhecimento, abertura para novas ideias, curiosidade com relação aos aspectos menos conhecidos do funcionamento da organização, e humildade para aprender de subordinados ou pessoas mais jovens, são exemplos de posturas que toda pessoa que deseja adquirir uma visão holística precisa adotar. Mais uma vez, deixaremos a discussão aprofundada desse assunto para outro artigo.

Ferramentas

Toda ocupação existe ferramentas adequadas. O biólogo precisa de seu microscópio, o profissional de finanças de suas “calculadoras” (desde simples planilhas até sofisticados sistemas de ERP e BI), o médico precisa de seu estetoscópio e seu esfigmomanômetro.

Da mesma forma, quem quiser ter uma visão holística da organização vai precisar de ferramentas adequadas. Então voltamos às questões do início deste artigo. Precisamos de ferramentas para trabalhar melhor com Estratégia, Arquitetura e Cultura.

Quando falamos de ferramentas aqui, não estamos necessariamente nos referindo a objetos físicos ou mesmo Software e Sistemas de Informação (embora estes possam ser importantes e necessários também).

Não. O foco nesse artigo está em métodos, frameworks, metodologias e modelos de referência.

Para a estratégia, existe há muito tempo uma multiplicidade de métodos e técnicas de Planejamento Estratégico, mas, como já defendi em outro lugar, a maioria desses métodos é insuficiente e não funcionam. Isso acontece por uma série de motivos, mas talvez o principal seja justamente a falta de visão holística, ou seja, a presunção de se fazer planejamento estratégico sem levar em conta a arquitetura e a cultura. Precisamos, portanto, de novos métodos de planejamento estratégico que não nos deixem perder a visão holística.

A arquitetura é, sem dúvida, o ponto mais sensível para a visão holística, uma vez que, ao descrever a organização como um todo, ela tende a ser muito complexa. Precisamos de um método para mapear a arquitetura atual, a arquitetura alvo (ou seja, aquela necessária para sermos capazes de executar a nossa estratégia e atingimos a nossa Visão), e, assim entendemos onde estamos e para onde queremos ir, o que nos levará ao nosso roadmap e a um Portfólio de Projetos relevante e alinhado com a estratégia e a cultura. E toda essa informação precisa estar armazenada de forma segura, coerente e facilmente acessível em diferentes níveis de detalhe e granularidade.  Discutimos esse assunto em mais detalhes neste vídeo.

Por fim, em relação à cultura, precisamos nos convencer da necessidade de estabelecermos uma Cultura Intencional, como discutimos em este outro vídeo. Também voltaremos a este assunto em um outro artigo.

Conclusão

Com as transformações e a aceleração nas mudanças no mundo dos negócios que estamos vivendo, os empresários, executivos e gestores em geral que conseguirem desenvolver uma visão holística terão uma enorme vantagem competitiva em suas carreiras pessoais e no sucesso de suas empresas.

Mas adquirir essa visão holística não é nem simples nem rápido. É um projeto. É uma meta, um Norte, algo a ser perseguido.

A consciência da necessidade de se adquirir essa visão é o ponto de partida.

Boa Viagem!

 P.S.  Os 3 vídeos linkados acima fazem parte de uma playlist no YouTube. Nessa playlist existe um quarto vídeo, que é, na verdade, o primeiro da série, e que mais ou menos introduz o assunto e replica em outro formato o conteúdo deste artigo. Convido você a assistir a Playlist inteira onde os quatro vídeos são a gravação de webinários que fiz para discutir essa questão. Aproveite e se inscreva no canal!


(Artigo originalmente publicado em http://arquiteturacorporativa.com.br/2019/09/visao-holistica-do-negocio/)


Atila Belloquim treina Executivos, Empresários, Empreendedores e Profissionais de Arquitetura de Negócios desde 2009 em como usar a Arquitetura de Negócios e a Cultura Intencional para obter uma Visão Holística de suas empresas. Trouxe para o Brasil o conceito de Arquitetura Corporativa de Negócios, foi o primeiro profissional Certificado em TOGAF no Brasil e o primeiro Instrutor acreditado para ministrar o curso oficial de TOGAF no país. É Sócio-Diretor da Gnosis Knowledge Solutions e é Bacharel em Ciência da Computação (IME-USP) e fez Mestrado e Doutorado em Administração (FEA-USP). 

Atila Belloquim

#1 Expert em Visão Holística = Estratégia + Arquitetura Corporativa de Negócios + Cultura Organizacional Intencional

4y

Pessoal, gostaria de sugerir a playlist no meu canal do Youtube que contém 4 gravações de webinars aprofundando esse assunto. Espero que gostem!  Link: http://bit.ly/yt-3componentes

Like
Reply
Rivaldo Guedes Corrêa Jr

PALC - Professional Agile Leader Certified, PACC - Professional Agile Coach Certified, PCM-A - Professional Coaching and Mentoring Accredited, BAP - Business Agility Practitioner, IMBA, PM4R®

4y

Ótimo artigo. De fato, tenho visto planejamento estratégico de curto alcance. Pior que isso, ações e projetos que apontam para direção contrária ao PE, projetos sem planejamento integrado, etc. Buscar a definição do norte e a manutenção do leme na direção que se quer é um desafio constante.

Lourenço Dias Silva

Profissional independente de Gestão educacional

4y

Não tenha receios de dar uma resposta Afirmativa ou uma resposta Negativa, exclua a partida: (i) Falta de Tempo - A falta de tempo é o maior Risco Reputacional que se pode acumular, podendo até criar fissuras onde menos se espera, por conseguinte o seu Valor no Mercado é Marginal. (ii) não é do meu Pelouro - não se revele fora do Ecossistema, assuma-se integrado na Era da Conectividade Contininu a, HBR (Maio, Junho 2019), Parceria Estratégica de Capacitação Estruturalmente Sustentável (PECES); (iii) subordinação - A Cortesia não tem preço, nem Direitos autorais, podendo ser copiada e piratiada, enquanto que Elegância é o preço que pagamos pela Cortesia, seja capaz de quando lhe apresentam uma proposta de "Negócio", de estruturar: (i) Leitmotiv - Causa ou Proposito; (ii) Elemento de Conexão; (iii) Consequência - 17 ODS.

Silmara Gonçalves

Head of Product | Group Product Manager | Product Leader

4y

Excelente artigo! Meu desafio atual!

Ana Cláudia Rodrigues

Transformação Digital | Inovação | IA | Agilidade | Mentoria de Negócios

4y

Parabéns Átila. Excelente artigo. T-shaped profile deve ser o objetivo. Concordo com você.

To view or add a comment, sign in

Explore topics